
O ministro da Casa Civil, Rui Costa (PT), foi apontado como principal suspeito de vazar à imprensa detalhes de uma conversa reservada entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a primeira-dama Rosângela da Silva, conhecida como Janja, e o presidente da China, Xi Jinping, durante um jantar oficial em Pequim na terça-feira (13). O episódio, que envolveu comentários de Janja sobre os supostos efeitos nocivos do TikTok no Brasil, causou mal-estar na comitiva brasileira e expôs tensões internas no governo, levantando questionamentos sobre lealdade e disciplina no núcleo do Palácio do Planalto.
O incidente ocorreu no último dia da visita oficial de Lula à China, que teve como objetivo fortalecer parcerias econômicas e políticas com o governo de Xi Jinping. Segundo relatos obtidos por colunistas como Andréia Sadi (G1) e Mônica Bergamo (Folha de S. Paulo), Janja pediu a palavra durante o jantar para abordar os impactos do TikTok, plataforma chinesa controlada pela ByteDance, que ela considera favorecer conteúdos de extrema direita e representar riscos para mulheres e crianças no Brasil. A intervenção, não prevista na pauta, foi vista como desrespeitosa por membros da delegação chinesa, incluindo a primeira-dama Peng Liyuan, e gerou constrangimento entre os brasileiros presentes, que consideraram a fala um ponto negativo em uma viagem marcada por avanços diplomáticos.
Lula, em coletiva de imprensa em Pequim na mesma terça-feira, tentou minimizar o episódio, afirmando que ele próprio iniciou o diálogo sobre o TikTok ao perguntar a Xi Jinping se a China poderia enviar um representante para discutir a regulação digital no Brasil. “A Janja pediu a palavra para explicar o que está acontecendo no Brasil, sobretudo contra as mulheres e as crianças. Foi só isso. Eu não me senti nem um pouco incomodado”, declarou o presidente, defendendo a primeira-dama e destacando que ela “não é cidadã de segunda classe” e possui conhecimento em questões digitais. Xi Jinping, segundo Lula, respondeu que o Brasil tem autonomia para regular ou até banir a plataforma, uma posição interpretada como diplomática.
O vazamento da conversa, classificada por Lula como “muito confidencial e pessoal”, provocou irritação no presidente, que questionou publicamente como a informação chegou à imprensa. “Estavam só os meus ministros lá, o [presidente do Senado] Davi Alcolumbre e o [deputado] Elmar Nascimento. Alguém teve a pachorra de ligar para alguém e contar”, afirmou, sugerindo que um integrante da comitiva – sem citar nomes – foi responsável pela indiscrição. Nos bastidores, segundo fontes próximas ao governo, Rui Costa emergiu como o principal suspeito, uma acusação alimentada por relatos de atritos anteriores com Janja.
Rui Costa, descrito por Lula como o “ministro mais importante” de seu governo, tem histórico de tensões com a primeira-dama, incluindo divergências sobre gastos do gabinete de Janja e a nomeação de cargos, como a escolha de Márcia Lopes para o Ministério das Mulheres, que contrariou preferências de Costa. Aliados do ministro, no entanto, negam sua responsabilidade e sugerem que ele está sendo usado como “bode expiatório” para desviar o foco de críticas à atuação de Janja, que mantém um “gabinete informal” no Planalto com pelo menos 12 assessores. Até o momento, Costa não se pronunciou oficialmente sobre as acusações, e sua assessoria não respondeu a pedidos de comentário.
Do ponto de vista de uma imprensa alinhada à direita, o episódio expõe a fragilidade da governança de Lula, marcada por descoordenação e disputas internas que comprometem a imagem do Brasil no exterior. A intervenção de Janja, embora motivada por preocupações legítimas sobre os impactos das redes sociais, reflete uma postura que críticos consideram inadequada para o contexto diplomático, especialmente em um encontro com um líder como Xi Jinping, cuja cultura política valoriza a formalidade. O vazamento, atribuído a Costa, reforça a percepção de um governo incapaz de manter a coesão, onde até mesmo figuras centrais, como o chefe da Casa Civil, podem agir contra os interesses do Planalto.
A suspeita sobre Rui Costa, se confirmada, pode ter consequências graves para sua posição no governo. O ministro, que coordenou a agenda preparatória da viagem à China e é peça-chave na articulação do Novo PAC, enfrenta agora um teste de confiança com Lula, que tem restringido seu círculo íntimo em resposta a vazamentos. Para a oposição, o caso é mais uma oportunidade de explorar as divisões no PT, apontando a influência de Janja como um fator de instabilidade. Enquanto o Brasil busca consolidar sua posição no cenário global, episódios como este arriscam projetar uma imagem de amadorismo, em detrimento dos interesses nacionais.
O desdobramento da crise, que Lula tenta conter antes de retornar ao Brasil, será decisivo para o futuro político de Costa e para a gestão da narrativa em torno de Janja. Por ora, o vazamento permanece como um lembrete dos desafios de um governo que, mesmo em momentos de êxito diplomático, não escapa das suas próprias contradições internas.