
A confirmação da condenação da ex-presidente Cristina Fernández de Kirchner a seis anos de prisão por corrupção, em 10 de junho de 2025, pela Suprema Corte da Argentina, desencadeou uma onda de apoio da esquerda argentina, que classifica a decisão como uma manobra de “lawfare” para neutralizar a líder peronista. Condenada por administração fraudulenta no caso “Vialidad”, que envolve desvios de US$ 1 bilhão em licitações de obras públicas na província de Santa Cruz, Kirchner, atual presidente do Partido Justicialista (PJ), foi inabilitada para cargos públicos e enfrenta a possibilidade de prisão, embora possa cumprir a pena em regime domiciliar por ter mais de 70 anos. Milhares de militantes peronistas e aliados de movimentos sociais tomaram as ruas de Buenos Aires, bloqueando rodovias e protestando em frente à sede do PJ, onde Kirchner discursou, denunciando uma “perseguição judicial” orquestrada pela direita e pelo governo de Javier Milei. Líderes regionais de esquerda, como Lula e Alberto Fernández, também manifestaram solidariedade, enquanto o PT e figuras como Gleisi Hoffmann reforçam a narrativa de que a condenação visa enfraquecer os movimentos populares na América Latina.
A Reação da Esquerda: Mobilização e Denúncias de Lawfare
Logo após o anúncio da Suprema Corte, em 10 de junho, Cristina Kirchner convocou apoiadores para um ato em frente à sede do Partido Justicialista, no centro de Buenos Aires. Em um discurso inflamado, transmitido ao vivo por redes como Página/12 e El Destape, a ex-presidente afirmou: “Esta sentença estava escrita desde o início. Não é por mim, é pelo povo, pelos direitos conquistados.” Ela acusou juízes ligados ao ex-presidente Mauricio Macri, aliado de Milei, de conduzirem um processo viciado para bani-la da política, comparando sua situação à de Lula, cuja prisão em 2018 foi anulada pelo STF em 2021. A fala ecoou entre os manifestantes, que ergueram cartazes com frases como “Cristina Resiste” e “Não ao Lawfare”.
De acordo com o Clarín, bloqueios em rodovias de acesso à capital, como a Panamericana, foram organizados por movimentos como La Cámpora, liderado por Máximo Kirchner, filho de Cristina, e pela Central de Trabalhadores da Argentina (CTA). A ex-deputada brasileira Manuela d’Ávila, presente em um dos protestos, participou de uma “aula pública” sobre lawfare, reforçando a solidariedade da esquerda brasileira. “Cristina é alvo do mesmo sistema que perseguiu Lula. A direita usa o Judiciário para destruir líderes populares”, declarou d’Ávila à RFI. A mobilização também ganhou força nas redes sociais, com hashtags como #CristinaInocente e postagens de usuários como @somoscorta, que afirmaram: “Sem uma prova, querem condenar Cristina para disciplinar os que lutam.”
O Caso Vialidad: Acusações e Controvérsias
O caso “Vialidad” envolve 51 licitações de obras rodoviárias na província de Santa Cruz, reduto político dos Kirchner, entre 2003 e 2015, durante os governos de Néstor Kirchner (2003-2007) e Cristina (2007-2015). Segundo o Ministério Público, Cristina liderou uma organização criminosa que favoreceu o empresário Lázaro Báez, amigo do casal, com contratos superfaturados e obras inacabadas, causando prejuízo de US$ 1 bilhão aos cofres públicos. Báez, condenado a seis anos por lavagem de dinheiro no caso “Ruta del Dinero K”, teria repassado parte dos recursos a empresas ligadas aos Kirchner. A sentença, confirmada em primeira instância em 2022, em segunda instância em 2024 e agora pela Suprema Corte, inclui inabilitação perpétua para cargos públicos.
A defesa de Cristina, liderada por Carlos Beraldi, contesta a falta de provas diretas e aponta irregularidades no processo, como a atuação de juízes supostamente ligados a Macri. Axel Kicillof, governador de Buenos Aires e aliado de Cristina, declarou em 31 de maio, durante o lançamento do Movimento Direito ao Futuro: “Querem condenar Cristina sem uma única prova. É uma perseguição para calar o peronismo.” A esquerda argentina também questiona a auditoria da Vialidad Nacional, que atestou a conclusão das obras, e a ausência de evidências de enriquecimento ilícito por parte de Cristina, reforçando a tese de perseguição política.
Solidariedade Regional: Lula, PT e Líderes Latino-Americanos
A condenação de Cristina mobilizou líderes de esquerda na América Latina. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que telefonou para Kirchner em 11 de junho, publicou no X: “Manifestei toda a minha solidariedade a Cristina, vítima de uma perseguição judicial que visa excluir líderes populares da política.” A presidente do PT, Gleisi Hoffmann, também repudiou a sentença, afirmando: “Três juízes indicados por Macri condenaram a presidenta do maior partido de oposição. É um ataque à democracia argentina.” A ex-presidente Dilma Rousseff, que em 2022 já havia comparado o caso de Cristina ao seu impeachment, reiterou o apoio, chamando a condenação de “tática da extrema-direita” para interditar progressistas.
Alberto Fernández, ex-presidente argentino e ex-aliado de Cristina, emitiu uma nota de solidariedade, apesar de rusgas passadas: “Cristina é vítima de uma Justiça manipulada pela direita. O peronismo não se curvará.” Outros líderes, como o ex-presidente boliviano Evo Morales, expressaram apoio, classificando a sentença como “violência política contra o povo argentino.” O Foro de São Paulo, que reúne partidos de esquerda latino-americanos, planeja uma reunião em Caracas para discutir o “lawfare” contra lideranças progressistas, com Cristina como caso central, segundo fontes do PT.org.br.
O Impacto Político: Kirchner e as Eleições de 2025
A condenação de Cristina, que assumiu a presidência do Partido Justicialista em novembro de 2024, ocorre em um momento crítico para a oposição argentina. Com a popularidade do governo ultraliberal de Javier Milei em queda devido à inflação de 200% e cortes em programas sociais, Cristina planejava disputar uma vaga como deputada nas eleições legislativas de setembro de 2025. A inabilitação, porém, frustra esses planos, forçando o peronismo a buscar novos líderes. “Cristina é insubstituível, mas o movimento é maior que uma pessoa”, afirmou Kicillof à Télam, sinalizando sua própria ascensão como possível candidato.
A direita, representada por Milei e aliados como Mauricio Macri, celebrou a decisão. Milei, em discurso no Congresso, afirmou: “A Justiça finalmente pune os corruptos que devastaram a Argentina.” No entanto, analistas do La Nación alertam que a prisão de Cristina, mesmo em regime domiciliar, pode galvanizar o peronismo, transformando-a em uma “mártir” política. A tentativa de assassinato sofrida por Kirchner em 2022, por um militante de extrema-direita, reforça essa narrativa, com aliados comparando sua resistência à de líderes históricos como Juan Perón.